Bem-vindo ao polêmico “neuromarketing”, a disciplina que recorre à medicina para entender (e influenciar) o cérebro
O marketing acaba de atingir uma nova fronteira: o cérebro humano. Dispostos a entender a essência do comportamento do consumidor, os marqueteiros estão descendo às camadas mais profundas da mente humana, em um esforço que talvez só Aldous Huxley, o autor do clássico de ficção científica Admirável Mundo Novo, teria sido capaz de imaginar. Utilizando novas tecnologias da medicina e da biologia, como a ressonância magnética e a tomografia computadorizada, os cientistas das vendas querem mapear como cada um dos nossos neurônios reage ao estímulo de uma marca, ao sabor de um refrigerante ou aos apelos de um simples outdoor na rua. A expectativa é de que, no futuro, as empresas consigam entender com um nível de detalhamento inédito quais são os fatores que desencadeiam toda a corrente de desejos, necessidades e anseios que leva uma pessoa a achar que vale a pena pagar um pouquinho mais por determinado produto. Essa surpreendente abordagem, que remete à controvertida idéia do vendedor que lê a mente, vem sendo designada por um nome bastante sugestivo: neuromarketing.
Por enquanto, ninguém precisa ficar preocupado com a possibilidade de ter sua mente invadida. A verdade é que o neuromarketing é uma disciplina ainda nova e que, até agora, fez avanços modestíssimos. “É mais ou menos como se você estivesse falando de viajar à Lua em 1940, entende?”, explica Jaime Troiano, diretor da Jaime Troiano Consultoria de Marca e Comportamento do Consumidor. Mas, apesar de engatinhar, a nova disciplina entusiasma os profissionais da área de publicidade, comunicação e marketing. “O neuromarketing é um recurso fantástico”, admira-se o consultor Marcus Paim, diretor da Ferreira Paim Dinâmica Empresarial e um especialista no assunto. Com os equipamentos da medicina, os primeiros pesquisadores de neuromarketing fotografaram o cérebro durante o processo de tomada de decisão. A partir daí, com base nos estudos que apontavam quais regiões do cérebro são responsáveis por determinadas funções (como emoção, racionalidade e memória), foi possível enxergar as funções cerebrais ativadas por determinado estímulo.
Por exemplo, um fabricante de automóveis poderá escanear o cérebro de um consumidor-cobaia para saber que tipo de relação as pessoas têm diante de um novo veículo – mais emotiva ou mais racional. Essas informações, acredita-se, poderão orientar campanhas publicitárias e estratégias de marketing mais eficazes. Mais do que isso, as pesquisas deverão servir de referência no desenvolvimento de futuros produtos. No momento em que as empresas souberem, com rigor científico, como criar mercadorias que despertem o desejo de consumo no ser humano, a garantia de retorno será total.
A tese não é nova. Em 1957, um livro de Vance Packard, hoje considerado um texto cult no meio publicitário, trouxe à tona a idéia da comercialização de produtos através da dominação de mentes. Em The Hidden Persuaders, Packard dizia: “O uso da psicanálise dirigida às massas para guiar campanhas de persuasão se tornou a base de uma indústria multimilionária. Persuasores profissionais dela se apropriaram em sua procura de meios mais eficazes para vender-nos suas mercadorias” (em tradução de Roberto Romano na Gazeta Mercantil de 26/11/2004). Credita-se a Packard o acréscimo da pimenta que faltava à publicidade no final dos anos 50. Com o surgimento do neuromarketing, o argumento central do autor ganha uma força assustadora. Agora, os profissionais do marketing têm a chance de observar as reações do cérebro em tempo real. No futuro, acreditam os eufóricos, em uma pesquisa qualitativa, será possível anotar as intenções inconscientes dos entrevistados em vez de simplesmente registrar as respostas objetivas, racionais – e nem sempre sinceras – de cada um deles.
A anatomia de uma escolha
1. Córtex orbitofrontal
Faz parte do lobo frontal do cérebro, que desempenha um papel importante em aspectos cognitivos e emocionais de um processo de decisão.
2. Córtex pré-frontal médio
Nas imagens geradas por ressonância magnética funcional, este pequeno ponto costuma se “iluminar” quando as pessoas se identificam com algo ou alguém.
3. Striatum
Conecta-se com o córtex orbitofrontal, a amígdala e outras partes do interior do cérebro relacionadas à sensação de recompensa.
4. Putâmen
Costuma agir quando as pessoas saboreiam ou enxergam algo de que elas gostam. Está relacionado ao controle do prazer e satisfação.
5. Sistema límbico
Envolve quase toda a seção destacada na imagem acima. É uma espécie de central de processamento
das emoções.
6. Amígdala
Esta minúscula área desempenha uma função vital no controle das emoções: é geralmente ali que se manifesta o medo.