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Designers – Criadores da imortalidade?

Foi a relação existente entre o designer, suas criações e o desejo que me levou a escrever uma monografia para o curso de especialização em design e cultura e que mais tarde se tornou a publicação do meu livro, Iphone: objeto de desejo.

Neste artigo, procurei fazer uma síntese de alguns capítulos juntamente com as minhas conclusões.

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O objeto de desejo se torna verdadeiramente um dos objetivos principais de nossas vidas. É ele que nos impulsiona a evoluir, desenvolver, progredir, criando assim condições de possuí-lo. Para cada fase de nossa vida temos um objeto que passa a ser alvo do nosso desejo, e assim vamos passando num processo de desejo, meta e conquista.

Mas o que estes objetos têm que nos fascinam?

O desejo que os objetos despertam nos seres humanos é motivo de pesquisa de muitos estudiosos, principalmente dos designers. Quando alguém cria um objeto, ele consegue imprimir em sua obra elementos com os quais as pessoas são despertadas para o seu encantamento, pela via da fascinação, do fetiche, do desejo.

De acordo com Alain Badiou, em sua obra “Para uma Nova Teoria do Sujeito” (1994), existe uma nova teoria para este mesmo sujeito. Segundo o autor, o sujeito contemporâneo difere totalmente daquele sujeito passivo e patético que conhecemos, de anos atrás, aquele que sofre, que identifica o sofrimento e sabe que este é preciso”. Badiou propõe algumas indicações para uma teoria do sujeito que passa pelo sentido do que ele chama “o ser imortal do mortal humano”.

De início, há apenas um animal, chamado, em certas circunstâncias, a tornar-se sujeito. O que significa que tudo que ele é, seu corpo, suas capacidades são, em dado momento, requisitados para que uma verdade faça seu caminho. É então que o animal humano é chamado a se tornar o imortal que não era. Nesse livro, Badiou faz uma afirmação interessante: “O direito do Homem é primeiramente o direito a resistência humana. Ao fim, morremos todos nós e só resta o pó. Há, entretanto, uma identidade de Homem como imortal, no instante em que ele afirma o que é, contra o querer-ser-um-animal ao qual a circunstância o expõe. Cada homem, isto é por demais sabido, é capaz de ser imortal; em grandes ou pequenas circunstâncias, por uma verdade importante ou secundária, isto pouco importa” (BADIOU, 1994, p.108).

Acredito que esta proposta de Badiou para um novo sujeito nos faz refletir sobre a nossa condição real de meros mortais, enquanto pessoas comuns e ao mesmo tempo seres imortais, deuses mesmo, quando de uma forma efetiva conseguimos ultrapassar os limites do comum, criando o incomum, aquilo que perdura pelos tempos, mesmo depois de nossa ausência.

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Considerando estas questões de Badiou sobre o novo “sujeito”, podemos entender que o ser humano tem uma necessidade de se tornar imortal e a sua impotência gera ações no cotidiano que nos impelem a estar sempre na busca de “algo” que possa nos imortalizar.

“Criar” – esta palavra tem um forte significado, pois retrata o surgimento de “algo” que poderá ter a possibilidade de nascer e ter uma vida útil por um determinado tempo, ou nascer e se tornar algo atemporal. Assim, os designers, na busca dessa “imortalidade”, que na maioria das vezes deve ser inconsciente, talvez utilizem da emoção como ferramenta para materializar em suas obras elementos que despertam o desejo das pessoas.

Para Richard Moran, Professor de Filosofia da Universidade de Harvard, em seu livro Philosophy and Phenomenological Research (2004), o desejo em filosofia é uma tensão em direção a um fim, considerado pela pessoa que deseja como uma fonte de satisfação. É uma tendência algumas vezes consciente, outras vezes inconsciente ou recalcada. Quando consciente, o desejo é uma atitude mental que acompanha a representação do fim esperado, o qual é o conteúdo mental relativo a esta. Enquanto elemento apetitivo, o desejo se distingue da necessidade fisiológica ou psicológica que o acompanha por ser o elemento afetivo do respectivo estado fisiológico ou psicológico.

Tradicionalmente, o desejo pressupõe carência, indigência. Um ser que não carecesse de nada não desejaria nada, seria um ser perfeito, um deus. Por isso, Platão e os filósofos cristãos tomam o desejo como uma característica de seres finitos e imperfeitos. Por costume, de acordo com Moran, os filósofos cristãos viram o bem como o objeto do desejo. Segundo Moran, atualmente isso é questionado, pois ele acredita que o desejo não é sempre ou talvez nem mesmo freqüentemente do Bem ou do Racional.

Moran continua enfatizando que o desejo é um tipo de sentimento. Isso significa que ele faz parte do sujeito, agente ou pessoa, sem fazer parte do mundo. O desejo é uma atitude mental do sujeito em relação ao mundo. É subjetivo, não objetivo. Se é um sentimento, isto também significa que a ele temos acesso imediato e não-inferencial ao mesmo tempo. Ainda assim, estamos sujeitos ao auto-engano e a outras falhas relacionadas ao autoconhecimento quando exteriorizamos os nossos desejos.

A teoria epistemológica para o desejo de Moran é: “O desejo é um tipo de atitude mental. Os desejos podem ser atitudes mentais proposicionais ou acusativas. Quando se apresenta como atitude proposicional, trata-se de um desejo que certo estado de coisas se dê no mundo. Quando se trata de uma atitude acusativa, trata-se do desejo de certa coisa ou objeto” (MORAN, 2004).

Olhando o desejo como sinônimo de prazer, podemos analisar uma visão de Epicuro de Samos, filósofo grego do período helenístico. Das numerosas obras escritas pelo filósofo, só restaram três cartas que versam sobre a natureza, sobre os meteoros e sobre a moral, e uma coleção de pensamentos. Seu pensamento foi muito difundido e numerosos centros epicuristas se desenvolveram na Jônia, no Egito e, a partir do século I, em Roma, onde Lucrécio foi seu maior divulgador. Ele conceitua que o “sumo bem” reside no prazer e, por isso, foi uma doutrina muitas vezes confundida com o hedonismo. O prazer de que fala Epicuro é o prazer do sábio, entendido como quietude da mente e o domínio sobre as emoções e, portanto, sobre si mesmo. É a própria natureza que nos informa que o prazer é um bem. Este prazer, no entanto, apenas satisfaz uma necessidade ou aquieta a dor. A Natureza conduz-nos a uma vida simples. O único prazer é o prazer do corpo e o que se chama de prazer do espírito é apenas lembrança dos prazeres do corpo. O mais alto prazer reside no que chamamos de saúde.

Já para o autor Jean Baudrillard, em seu livro “O Sistema dos Objetos” (1968), ele retrata o desejo pelo objeto dizendo que cada objeto está a meio caminho entre uma especificidade prática, sua função, que é como seu discurso manifesto, e a absorção em uma série/coleção, onde se torna termo de um discurso latente, repetitivo, o mais elementar e o mais tenaz dos discursos. Este sistema discursivo dos objetos é homólogo àquele dos hábitos. Segundo ele o hábito é descontinuidade e repetição e não continuidade como o emprego sugere. É pela divisão do tempo em esquemas habituais que solucionamos o que pode haver de angustiante, de continuidade e de singularidade absoluta dos eventos. Devemos pensar, então, que o desejo se mantém num processo cíclico, onde a cada momento de nossas vidas desejamos “algo”, e esse “algo” naquele momento é o mais importante, até que outro evento aconteça e eu passe a desejar outro objeto que tem uma representação subjetiva de um novo momento, de algo novo, diferente da rotina.

Em outro livro, “O Kitsch” (1971), Abraham Moles afirma que o prazer existe apenas no instante, sendo ele nada mais individual, mais incerto, mais incomunicável. Os juízos que se fazem não permitem qualquer raciocínio, pois ao analisar seu tema, na verdade a ele acrescentam um atributo de indeterminação: dizer que um objeto é bonito é dar-lhe um valor de enigma! Na verdade, Moles acredita que existe uma sensualidade nos objetos que exerce poder de atração, junto com outros signos, nos seres humanos.

Os signos de um objeto podem ser diversos. Eles também estão a serviço de funções objetivas como a ergonomia, na medida em que o objeto pode ou não expressar sua função. Quantas vezes não nos deparamos com coisas que não sabemos para que servem, e, ao contrário, como é confortável usar um objeto que nos indica para que serve. E os signos estão a serviço da subjetividade quando compramos um produto cujo atributo é mostrar que temos poder ou informar a que “clube” pertencemos (as grifes estampadas nos produtos que usamos).

A função estética é uma função subjetiva e também é sígnica. Diz respeito ao sujeito e comunica muitas coisas. Por sua definição, a função estética deveria estar mais ligada à emoção e ao sentimento que um objeto suscita do que propriamente à sua beleza, e como a maioria dos autores afirma, isto porque o “belo” é um conceito relativo, ou melhor, arbitrário, pois é mutável conforme a sociedade. Fala-se muito sobre a estética burguesa dominante ou “bom gosto”, que sem dúvida é formadora de opinião e pertence a uma classe.

De acordo com o americano Richard Florida no livro “The Rise of the Creative Class” (A Ascensão da Classe Criativa), ter boas ideias é apenas o começo de um longo percurso. É preciso entender o que transforma uma boa ideia em um produto ou serviço de sucesso.

Florida afirma que no estágio atual do capitalismo, a criatividade não surge só como um diferencial, mas como a própria razão de ser da economia. Se a transição da agricultura para a era industrial foi baseada em recursos naturais e na força de trabalho, a revolução agora em curso é potencialmente maior e mais poderosa. A atividade econômica passou a se basear na inteligência e na capacidade de inovar e daí emergiu um novo perfil de trabalhador, a “classe criativa”.

Richard acredita que os designers fazem parte da nova classe criativa existente em vários mercados e que essa mesma classe é a responsável pela forma como trabalhamos nossos valores e desejos, ou seja, tornaram-se a grande “filosofia visual” do nosso cotidiano. “Como essa criatividade é o motor do crescimento econômico, em termos de influência a classe criativa está se tornando à classe dominante em nossa sociedade”, afirma Florida (2002).

Estamos vivendo num mundo de estetização generalizada e esta característica cada vez mais evidencia a relação entre estética, design e desejo. Estas três palavras são responsáveis pela fascinação dos objetos, uma vez que a maioria das pessoas na atualidade valoriza mais a função subjetiva deles.

Os designers são a parte mais visível de uma nova e cada vez mais influente categoria de profissionais, daqueles que usam a criatividade como fator-chave nos negócios, na educação, na medicina, no direito ou em qualquer outra profissão.

O aumento na oferta de produtos com desenho inovador acabou por criar uma via de mão dupla: o consumidor também passou a exigir objetos mais bonitos e com os quais se identifique. Vivemos uma época única, em que a estética se tornou prioridade porque ficou mais fácil enfeitar nosso dia a dia, nossa vida, e bem lá no fundo é exatamente isto o que queremos.

Podemos também pensar que o desejo possa estar ligado a uma espécie de “jogo da sedução”, onde tudo aquilo que vemos não é possível de ser tocado ou possuído, e talvez este seja um poderoso fator que gere a fascinação e encantamento nas pessoas por um determinado objeto.

Quando a Apple lançou seu novo produto (Iphone) no mercado e gerou uma “prisão” desse produto atrelando-o a uma companhia de telefonia celular, essa prisão simbólica de certa forma provocou ainda mais o desejo das pessoas pelo aparelho. Se analisarmos, de uma forma figurada, a própria loja da Apple em Nova York, com paredes de vidro, perceberemos a intenção de criar uma grande vitrine para os olhos, onde se pode observar, mas não se pode tocar, veremos ai o movimento do próprio do desejo em sua pura estratégia: sedução x impossibilidade.

É possível que a Apple tenha feito e ainda faz muito sucesso com o iPhone e com a maioria de seus produtos porque ela não vende apenas produtos, mais que isso, ela vende um estilo de vida. As pessoas estão cada vez mais ávidas por pertencerem a tribos, que são escolhidas por diversos parâmetros ligados ao próprio estilo de vida de cada um.

O “jogo da sedução” está deixando de ser uma relação apenas entre pessoas para ser também uma relação entre pessoas e objetos.

Então podemos pensar que o iPhone, entre vários produtos no mercado, será aquele que por via direta tornará o seus criadores “imortais”.

autor: Camilo Belchior
fonte: http://abcdesign.com.br

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