É cada vez mais difícil ver um anúncio composto somente por texto (os famosos “all type” ou – se deixarmos de lado a mania de importar expressões – “só-texto”). Por que será? Não sei a resposta, mas podemos brincar de tentar encontrá-la. Será porque cada vez mais vivemos num império de imagens? É uma boa opção. A tecnologia foi dotando o trabalho com a imagem de diversas novas ferramentas e possibilidades, tornando esse universo muito interessante tanto para quem produz a imagem quanto para quem a consome. Quanto ao texto, o que mudou? Alguma nova tecnologia alterou a maneira de se trabalhar com o texto? A mídia digital forçou uma adaptação dos textos, fazendo com que redatores tivessem que repensar sobre sua atividade, mas, na verdade, a essência não mudou. Ter que adaptar linguagem para escrever num site, blog ou Twitter é só mesmo adaptação e não inovação. Nenhum programa informático dá o poder ao redator de retocar as falhas do seu texto e deixá-lo mais bonito ou sem falhas, como aconteceu, por exemplo, com a imagem (acho duvidoso, pouco confiável e não recomendo o corretor ortográfico do Word). O texto não tem 3D, filtros ou máscaras. O que a informática possibilitou, sim, ao texto foi justamente mexer com a parte imagética das letras, como tamanho, fontes e cores. Isso é ver o texto como imagem e assim voltamos ao ponto inicial. Outra questão a ser considerada ainda dentro do quesito tecnologia é que a imagem é uma propriedade natural, enquanto o texto escrito, não. Um bebê abre os olhos e aos poucos minutos de vida entra em contato com a linguagem das imagens. Naturalmente, ele aprende a decodificá-las e interpretá-las. O texto oral vem em seguida e, o escrito, somente muitos anos depois, e de forma não-natural. O texto escrito, ao contrário da imagem natural, por si só já é uma tecnologia. Hoje quase não nos damos conta disso, mas a invenção da escrita revolucionou tanto ou muito mais a história da humanidade do que a invenção dos computadores. A escrita é uma tecnologia que inclusive divide a história entre pré-história e história propriamente dita (e quem sabe, no futuro, os livros – se é que ainda existirão – estabeleçam a invenção dos computadores como um marco divisório entre a história e a “pós-história”, quando o homem teria começado a perder importância em detrimento da máquina…)
Para um publicitário, trabalhar com imagem é parecido a uma brincadeira. Eu tenho mais amigos diretores de arte do que redatores e vejo o prazer em seus olhos. Sentar-se em um computador para trabalhar com uma imagem é uma atividade lúdica. Quanto aos redatores, o que observo nos olhos de muitos – inclusive de muitos alunos – é sofrimento. Trabalhar com texto é chato e trabalhar com imagem é legal. Isso se pode ouvir nos corredores das faculdades de comunicação e se pode sentir dentro das salas de aula. O texto escrito, essa milenária tecnologia, perdeu a graça. Essa pode ser uma das respostas a nossa pergunta inicial: por que é cada vez mais difícil ver anúncios só-texto?
Mas vejamos também o outro lado: o receptor da publicidade. O publicitário cria para um público, é óbvio. Ele tenta chamar sua atenção, surpreendê-lo. E o que surpreende mais hoje em dia, uma imagem forte e inusitada ou um bloco quadrado cheio de palavras? Depende. O criador publicitário está tomando como lei a máxima de que “ninguém lê texto”. Isso é perigoso e resulta em publicidade de baixa qualidade. Porque as pessoas lêem, sim, desde que o assunto lhes interesse. Quem tem filho pequeno quer saber informações sobre o carrinho ou a fralda que está prestes a adquirir. Quem está pensando em comprar um carro quer ler o máximo de informações possíveis antes de tomar sua decisão. Organizar essas informações em um texto atraente, elegante, simpático, bem escrito e adequado ao seu público-alvo é a função do redator. Eu, por exemplo, gosto de rock e sempre me interessei pela cultura pop em geral. Por isso eu li de cabo a rabo, e com muito prazer, o texto desse sensacional anúncio de 20 anos da MTV:
Essa lenda de que ninguém lê texto é prejudicial à agência e ao cliente. É prejudicial também aos estudantes. O novo redator começa a trabalhar já intimidado. Nas reuniões de criação ele sequer ousa pensar em sugerir um anúncio só-texto porque, afinal, “ninguém lê texto” mesmo. Ele chega a se autocensurar e isso é um passo para que comece a se atrofiar. Isso tem acontecido hoje em dia com os redatores e eu sinto uma profunda pena quando penso nessa situação. O texto acima, da MTV, tem uma imensa carga persuasiva, que nenhuma imagem conseguiria comunicar. Eu, que faço parte desse público-alvo, tive vontade de assistir a MTV assim que terminei de ler o anúncio. E, ainda por cima, o texto me fez viajar por distintas épocas da minha juventude, despertando automaticamente em mim um enorme carinho pela marca MTV, uma sensação de cumplicidade com essa emissora. O texto em primeira pessoa foi uma grande sacada, assim como as referências não totalmente explícitas a diversos artistas e bandas, exigindo a participação do leitor nesse jogo de decifrar. “Tudo isso em um anúncio só-texto?”, você poderia se perguntar. Sim, eu respondo. É só texto, mas eu gosto.
autor: Sérgio Calderaro
fonte: http://www.acontecendoaqui.com.br
Uma resposta
Sou redatora e tenho a maior dificuldade em criar um título revolucionário, onde descreva em 3 palavras tudo de bom que o produto / serviço oferece. Fico horaaas pensando em algo legal. Também não queria que o all type "morresse", mas vai apresentar um texto gigante pra um cliente pra ver o que acontece!