O difícil desafio de se manter autêntico. Consumidores desconfiam cada vez mais de empresas que se distanciam de suas raízes
Paradoxos da globalização: quanto mais “plano” é o mundo (tomando emprestada a expressão do jornalista Thomas Friedman), mais o consumidor anseia pelo que é pessoal, distinto e memorável. Em outras palavras, autêntico. A afirmação é dos consultores Joseph Pine e James Gilmore, no recém- lançado Authenticity: What Consumers Really Want (“Autenticidade: o que os consumidores realmente querem”). O título da obra, sem rodeios, dá o recado: a percepção de um produto ou serviço como autêntico é cada vez mais importante para o sucesso mercadológico.
Como definir autenticidade? Assim como outras definições subjetivas (beleza, honestidade), o melhor a fazer é detectá-la em exemplos concretos. Foi o que a dupla de marketing fez, tanto no livro quanto no site/blog que mantém sobre o assunto, authenticitybook.com. Os exemplos, afortunadamente, são abundantes. No caso da marca de jeans PRPS, criada pelo norte-americano Donwan Harrell, que largou a faculdade para cruzar o mundo de mochila, ela nasceu de suas observações de viagem, e das indagações delas decorrentes. Tocado pelas dificuldades econômicas da África e impressionado com a beleza do design no Japão, que impregna a vida japonesa nos mínimos detalhes, tirou daí a inspiração para a PRPS. Um jeans feito com algodão africano (e lucros parcialmente revertidos às comunidades locais), desenhado e fabricado no Japão. “O PRPS é uma roupa feita por gente que tem paixão por jeans”, diz Harrell, sem falsa modéstia.
Há riscos quando uma empresa se afasta da imagem que a tornou conhecida
Um caso clássico de autenticidade é o da Nike, afirmam Pine e Gilmore. Um dos segredos de marketing da fabricante de material esportivo é o de saber calcular com precisão o valor da experiência do consumidor, que acaba se tornando um chamariz de marketing de produto. Usuários do Nike+ – sensor eletrônico que detalha e controla o progresso do treinamento de corrida, e cujos dados podem ser carregados num iPod e depois transferidos para o site da Nike – já formaram comunidades online de adeptos do tênis e de apaixonados por esportes. O preço do aparelhinho, US$ 29, mal cobre seu custo de produção. “Ele é tanto um produto quanto um investimento de marketing”, diz Trevor Edwards, vice-presidente global de marketing e construção de marca da Nike. Em Nova York, o 3º andar da loja de Manhattan ficou conhecido como “clube dos corredores”. Ali, os entusiastas podem mapear trajetos de corrida pela cidade ou receber aconselhamento de treino de profissionais contratados pela Nike. A companhia conseguiu voltar às suas raízes dos anos 70, de propaganda “de pé em pé” (num trocadilho com a propaganda boca a boca), quando os funcionários da marca eram quase todos corredores, discípulos de Bill Bowerman, treinador e co-fundador da companhia.
Por fim, Pine e Gilmore fazem o inventário de empecilhos à autenticidade. Entre eles, destacam o distanciamento da empresa de suas raízes, algo que acaba inevitavelmente acontecendo em operações marcadas pelo gigantismo, como é caso da Disney. A companhia constatou, em seu último parque temático, o California Adventure (inaugurado em 2001), que estavam faltando referências ao fundador da empresa e aos personagens por ele criados, sem o que a mágica Disney não funciona. O número de visitantes anual está 1 milhão aquém do esperado, o que fez a Disney planejar investimento de US$ 1,1 bilhão nos próximos cinco anos, num retoque radical do empreendimento. Os parques correspondem a 30% do faturamento do grupo, que é de US$ 34 bilhões.
Outro empecilho é o da ubiqüidade da marca. Isso tem atrapalhado, segundo eles, a vida da rede Starbucks. “Possuir uma cadeia de 13 mil lojas espalhadas pelo mundo é algo que mata a possibilidade de a empresa ser vista como genuína pelo consumidor”, dizem. Apesar do rigoroso padrão de qualidade da rede de cafés – que vai do treinamento de funcionários à escolha de fornecedores e design das lojas – ela tem sofrido com ações hostis na internet, de que são exemplos campanhas mal-humoradas como “Amigo não deixa amigo beber na Starbucks” (paródia às campanhas de responsabilidade ao volante), ou a distinção entre os Starbucks “verdadeiros” (as lojas mais antigas) e “falsos” (quiosques em aeroportos e shoppings, onde supostamente a qualidade da rede estaria diluída).
autor: Álvaro Oppermann
fonte: Época Negócio
Uma resposta
esse livre é muito interessante ele tem versão traduzida ??