A digitalização das empresas é um processo cada vez mais presente no mercado. É preciso tomar cuidado, porém, para que nessa transformação as empresas mantenham, o tempo todo, aquilo que é fundamental: o foco no cliente.
Todos nós reconhecemos diversas mudanças sensacionais que as novas tecnologias têm trazido na forma como consumimos e nos relacionamos com os provedores de produtos e serviços. Mas em alguns casos percebemos que as mudanças, em vez de oferecerem uma melhor experiência ao cliente, acabam criando novos atritos.
O grande problema é que algumas dessas empresas estão “migrando” para os ambientes digitais os mesmos problemas que já têm no mundo real, sem resolver suas causas.
Um exemplo disso são os processos de atendimento aos clientes, através de métodos automatizados, como robôs utilizados em canais de chats ou voz. Muitos bancos e serviços de TV por assinatura, internet telefonia etc. têm hoje suas assistentes virtuais.
Precisei recentemente utilizar um serviço desses, e a minha experiência foi extremamente frustrante. Comecei a navegar no menu de opções, que eram as únicas oferecidas. Nenhuma delas representava meu problema, que era até simples, e fui redirecionado várias vezes em círculos para o mesmo ponto, sem conseguir sair de um verdadeiro labirinto e sem ter o menor sinal de que meu problema seria ao menos entendido. Depois de muitos minutos tentando, a máquina “se cansou” e me abriu a possibilidade de falar com uma pessoa, que finalmente encaminhou o atendimento.
Quem nunca passou por algo semelhante, interagindo com um sistema automático que apresenta respostas que não têm nada a ver com o que você buscou? Na internet, multiplicam-se os quadros humorísticos sobre essas situações, mas quando elas acontecem conosco, não temos como achar a menor graça.
Sabemos que os call centers têm se tornado extremamente caros para diversas empresas, com contingentes enormes de pessoas necessárias para manter esse serviço. Primeiro porque seus processos apresentam muitos problemas. Segundo porque muitos clientes não têm suas questões resolvidas numa primeira ligação, por deficiências de processos e de treinamento de pessoas, criando uma bola de neve com cada vez mais reclamações.
Para mim, como cliente dessa empresa, a sensação que ficou é que ela não direcionou essa mudança digital (atendimento por chat automatizado) tendo como objetivo melhorar o serviço ao cliente. Claro que essas tecnologias estão evoluindo e vão melhorar muito, mas então sua implantação deveria preservar o cliente, enquanto ela ainda não consegue atender às mínimas expectativas. Não foi isso que experimentei. A impressão que fiquei é a de que, nesse caso, o principal propósito da empresa foi cortar drasticamente os custos de call center, criando uma barreira quase intransponível.
Se a prioridade fosse realmente o atendimento ao cliente, antes de criarem essa barreira teriam realizado mais experimentos, aguardando a inteligência artificial por trás do sistema evoluir e dando opções até que o sistema estivesse mais robusto. E mais importante ainda, teriam trabalhado nas causas raízes para melhorar os processos geradores das reclamações recorrentes e aperfeiçoado as formas de resolver prontamente os diversos tipos de problemas relatados.
As tecnologias digitais estão evoluindo cada vez mais rapidamente. E é claro que vão continuar a facilitar muitas coisas em nossas vidas. E abrirão muitas novas possibilidades para as organizações melhorem e inovarem seus negócios e processos.
Porém, não se pode perder o foco: só faz sentido promover transformações digitais se elas agregarem valor aos clientes; se elas melhorarem as experiências na relação com provedores de produtos e serviços. Qualquer desvio nesse propósito faz os clientes se sentirem ainda mais frustrados. Infelizmente foi isso que vivenciei. Não deixe que isso aconteça em sua empresa, busque a efetiva transformação digital, que precisa ter o cliente no centro e a melhoria de processos como pressuposto.
autor: Flávio Picchi
fonte: Época Negócios • Coluna Enxuga Aí