Há, como dizem alguns, uma crise e a necessidade de resgatar o brilho criativo perdido pela publicidade brasileira nos últimos anos? Ou tal percepção errônea decorre de outros fatores, como performances piores em premiações internacionais? Essa é uma das discussões que estarão na pauta da comissão A Criatividade Brasileira durante o IV Congresso Brasileiro de Publicidade, que acontece entre 14 e 16 de julho no World Trade Center, em São Paulo.
Alguns dos líderes criativos do mercado nacional são taxativos: não há crise alguma. “Isso é uma falácia. É conversa de argentino e de brasileiro com baixa auto-estima. O que há é um novo ciclo, que está sendo aberto com o aumento da importância das outras disciplinas da comunicação”, aponta Alexandre Gama, presidente e diretor geral de criação da Neogama/BBH. Para ele, essa nova realidade pede uma reformulação do perfil do criativo brasileiro. “Os profissionais terão de ser tão estrategistas quanto criativos”, acredita.
Silvio Matos, sócio-presidente e diretor geral de criação da MatosGrey, concorda que há uma mudança em curso: “De uma forma geral, os critérios estão sendo reavaliados. E, quando os critérios são repensados, os criativos ficam com medo. E criativo com medo não cria, não inova, não transforma, não insiste. Apenas resolve”.
Já o diretor de criação da Talent, João Livi, sustenta que há necessidade de melhorar a situação atual. “Nossa luta não é contra a boa propaganda dos outros países, mas contra os 70% de coisas intoleráveis que estão em veiculação. A parte ruim, burra, mendicante e de mediocridade impune da propaganda compromete a parte boa, que encanta, educa e diverte”, considera.
Durante o IV Congresso, o debate sobre A Criatividade Brasileira será comandado por Nizan Guanaes, presidente da Africa e principal acionista do Grupo ABC. Ele convidou para ser o palestrante da área seu mais novo sócio: o publicitário brasileiro PJ Pereira, que acaba de inaugurar a Pereira & O?Dell, em São Francisco, nos Estados Unidos. PJ poderá contribuir com a discussão sobre a escassez de campanhas internacionais criadas e produzidas no Brasil.
“Como um País que sempre procurou se defender das grandes campanhas internacionais pode se preparar para liderá-las? Se a Suécia e a Holanda podem, por que não o Brasil? E não falo de fazer um filme ou um anúncio que será veiculado em outros países. Falo de ter a liderança da conta. O que falta para o Brasil jogar esse jogo?”, questiona PJ. Na sua avaliação, a propaganda brasileira já faz, há muito tempo, o que as mais badaladas agências do planeta caracterizam como sendo a “comunicação moderna”: criar idéias que influenciem a cultura popular.
Atuando em uma multinacional que veicula no Brasil muitas campanhas criadas e produzidas no exterior, o diretor de marketing da Coca-Cola, Ricardo Fort, diz que as escolhas relativas ao dilema “adaptação versus produção” dependem das necessidades das marcas e do escopo de cada projeto. “A Coca-Cola já adaptou projetos internacionais no Brasil e o resultado foi tão bom que acabou sendo exportado para outros países. Existe muito espaço para criatividade nas adaptações também”, ressalva.
Na avaliação dos profissionais de agências, o que mais tira o foco brasileiro das campanhas internacionais é o bom momento do mercado interno. “O Brasil é um mercado forte e está em crescimento. A relevância local nos impõe que olhemos também para dentro – mesmo aqueles que historicamente buscaram olhar para fora. Mesmo as multinacionais sabem que têm de se voltar para o consumidor brasileiro de uma forma local, e não global”, sugere Alexandre Gama.
Outro assunto esperado pelos envolvidos nessa comissão é referente ao estilo de atuação das agências brasileiras e à necessidade de trabalhar a criatividade além dos limites da área de criação. Uma das dúvidas que pairam sobre o tema é: esse esforço tem sido valorizado pelos anunciantes?
“Os nossos anunciantes têm demonstrado grande ansiedade por idéias diferenciadas, até que elas são apresentadas e esquecidas na gaveta”, critica João Livi. Ele considera que é muito difícil melhorar a relação com os clientes quando as regras não são claras. Por esse motivo, espera que o IV Congresso contribua com “transparência e confiança”.
“Deve ser transparente a remuneração das agências, mas também a agenda das empresas e os objetivos comuns. Os anunciantes têm sido pródigos em falta de transparência, foco, metodologia, medições, respeito, confiança e reconhecimento. Um dos meus clientes insinuou em uma reunião que a agência estava querendo aprovar um trabalho para ganhar prêmios. Fiz uma declaração reconhecida em cartório de que não inscreveria a tal campanha em prêmio nenhum. Tirei o bode da sala – mas, cá para nós, precisava ter colocado o bode lá?”, questiona Livi.
Alexandre Gama também considera que a maioria dos anunciantes não está preparada para entender e valorizar o esforço das agências e as mudanças empreendidas no relacionamento entre as partes. “A maioria dos clientes ainda está presa a um modelo de operação que sequer permite que a agência possa ser generalista, já que esbarraria nas atribuições das agências especialistas. Há uma minoria que já entende e pratica essa nova visão, mas são poucos felizardos que estão à frente”, lamenta.
Salientando que não espera que o IV Congresso contribua para o aumento da criatividade do mercado brasileiro, mas sim para sua maturidade, Silvio Matos reforça que esse é o momento de repensar a atividade e apontar caminhos para o seu futuro. “A desculpa de que hoje qualquer um pode exercer a criação estratégica para uma marca se comunicar com o público não pode ser uma razão para desistirmos, mas sim uma motivação para melhorarmos”, incita.
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autor: Alexandre Zaghi Lemos
fonte: http://www.meioemensagem.com.br